quarta-feira, 3 de setembro de 2014

Gramsci e a vontade coletiva nacional-popular


Jean-Michel Basquiat 1984

Lendo Gramsci. 
“Nenhuma ação de massa é possível se a própria massa não está convencida dos fins que quer alcançar e dos métodos a serem aplicados”, ele escreveu em Alguns temas da questão meridional. A formação de uma “vontade coletiva”, para ele, era um componente indispensável do complicado e complexo processo de formação do Estado, ou de sua reorganização em sentido democrático.
Gramsci era marxista e comunista, mas com o tempo foi-se distanciando do leninismo. Não se tratava, para ele, de uma vontade coletiva encarnada em um partido-guia ou conduzido por algum herói. A “vontade coletiva nacional-popular” derivaria da irrupção simultânea dos diversos componentes da sociedade, urbana e camponesa, na vida política: seria um tornar-se Estado processado política e culturalmente, de modo a incluir regiões, classes, gêneros, etnias e gerações. Um processo mediante o qual e no qual as sociedades respirariam., indo além do jogo político restrito, institucionalizado.
Seu “moderno Príncipe” não era uma máquina simplesmente, mas um movimento político amplo, no qual partidos teriam lugar mas não seriam os únicos (nem talvez os principais) protagonistas. Este seu Príncipe “não pode deixar de ser o anunciador e o organizador de uma reforma intelectual e moral, o que significa, de resto, criar o terreno para um novo desenvolvimento da vontade coletiva nacional-popular no sentido da realização de uma forma superior e total de civilização moderna” (CC, 3, 18).
Educação, cultura, escolas, debate público, imprensa, ciência, arte e literatura são os recursos de que um povo-nação dispõem para se afirmar como vontade coletiva. Os intelectuais desempenham papel central nisso, como é evidente. Quanto mais estiverem eles “organicamente” articulados com as amplas massas de uma população, com os “subalternos”, os “humildes” (são termos de Gramsci) mais alta e relevante será sua função. Menos paternalistas serão e mais atuarão como elos de ligação e formadores de uma vontade coletiva que se faça Estado.
Ele escreveu isso há quase 90 anos. Mas a temática continua em aberto. No Brasil do início deste século XXI, dramaticamente em aberto.  

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