quarta-feira, 30 de dezembro de 2009

A falta de uma oposição

Não poderia ser mais melancólico o final do ano político. Em meio ao foguetório e às confraternizações habituais, oculta-se um quadro sem brilho, pobre, desqualificado, que não promete nenhum bom augúrio.

É um quadro curioso, que intriga precisamente porque não sugere qualquer indício de ameaça à estabilidade política ou de algo que esteja pondo em risco a democracia no país. Se nada ameaça a legalidade política, se tudo parece indicar que continuaremos a viver democraticamente, a assistir ao revezamento regular dos governantes e à eleição sem traumas dos parlamentares, por que persiste esse clima de indiferença e pessimismo com relação à política? Será que é por que tudo parece estar bem – ou muito bem, como pensam alguns – que ninguém no país se mostra civicamente comprometido, interessado em participar das decisões nacionais ou mesmo decidido a brigar para eleger os melhores representantes políticos?

Pode-se associar a isso ao menos uma dupla preocupação. Por um lado, se a política não funciona bem, não envolve nem compromete os cidadãos, aumenta o risco de que a cidadania não consiga se manter ativa e organizada, pressionando por seus direitos e vigiando os governos. Como poderá ela manifestar suas aspirações e lutar para garanti-las? Como serão formados os consensos que nortearão as escolhas dos governantes? Por outro lado, a inoperância da política pode significar um obstáculo a mais para os planos futuros da sociedade, tanto quanto para as promessas e os compromissos anunciados pelos governantes. Mesmo o tão aclamado e acalentado desenvolvimento ficará sob risco, e isso para não lembrar das expectativas de reforma social e melhoria da distribuição de renda, operações que são eminentemente políticas e dependem de forma crucial de consensos que somente a política pode produzir.

A sucessão de escândalos, a corrupção convertida em prática cotidiana, o baixo nível dos debates e a ausência dramática de propostas integradas e factíveis para se governar o país é a ponta de um iceberg que hoje aprisiona todo o campo político nacional. Não há partido que escape dele. Depois do caso Azeredo, em Minas, foi a vez do caso Arruda, no Distrito Federal, amplificado com os boatos de que novas revelações estariam prestes a atingir políticos de outras unidades da federação. Ou seja, ligando-se os fios ao mensalão de 2005, aos vários pequenos casos que a ele se seguiram, à indigência do Congresso e à opacidade programática dos partidos políticos, o resultado é que a sujeira e a mediocridade contaminaram o sistema inteiro.

Dada a variável tempo, o prejuízo acabou localizado: afetou a medula das oposições, tirando delas aquele sussurro “ético” que poderia se converter num dos eixos do discurso com que disputar o pleito de 2010. Ou seja, o que já era ruim, ficou péssimo. E as oposições chegaram ao fim do ano em situação de miséria política e programática, sem discurso, sem propostas, até mesmo sem candidatos e lideranças consensuais.

Quando se fala em oposições, fala-se em PSDB, DEM e PPS, partidos de caráter e dimensões distintas, mas que vêm falando linguagem semelhante e afinada.

Como articular coisas tão diferentes? Quem comanda, quem define os conteúdos, qual o papel de cada parceiro dessa operação? A “frente” oposicionista não responde a essas questões. Não é comandada por ninguém, não tem definições programáticas e não fala outro dialeto que não o anti-Lula, com pitadas improdutivas de frustração e udenismo moralista. Define-se como centro-esquerda, mas de esquerda não tem nada, sequer uma retórica. É algo que intriga, especialmente quando se lembra que o PPS é herdeiro do PCB e o PSDB se considera expressão da social-democracia, ou seja, são continuadores de tradições repletas de glórias e identidades, goste-se ou não delas. 2010 será um ano novo se esses partidos honrarem suas tradições.

Uma oposição sem discurso e sem coerência não deveria ser vista como objeto de desejo da situação. Pode ser que agrade a alguns setores governistas ou a parte da cúpula que conduzirá a campanha de Dilma Rousseff, pois é, afinal, um obstáculo eleitoral a menos. Mas é uma tragédia para a democracia e para a sociedade, especialmente porque deixa parcelas importantes da população sem um norte e reforça o clima de unanimidade que, ao não corresponder à realidade, funciona como um elixir de apatia e desinteresse. A ausência de uma oposição vigorosa não é boa para os governos em geral e muito menos para aqueles que se seguirão à era Lula, pois os despoja de “consciência crítica” e os deixa sem qualquer tipo de freio ou contraponto factível.

O ano só não terminou perfeito para a situação porque perfeição não existe. Não há como negar que o governo Lula abre 2010 em posição de vantagem, fortalecido pelos escândalos do último bimestre, pela alta popularidade do presidente e pelas previsões de que 2010 trará consigo crescimento econômico e mais benefícios sociais. Isso forma uma conjunção astral terrível para as oposições, roubando delas quase todas as fichas. Em nome do que se baterão os candidatos contrários a Dilma? A ladainha moralista ou gerencial, a denúncia do “assalto petista ao Estado” e as acusações de populismo serão inócuas, sobretudo se não forem apresentadas com um mínimo de razoabilidade e suporte factual.

Do lado governamental, há, é claro, os riscos inerentes a uma aliança com o PMDB, a conduta mercurial de parceiros pesados como Ciro Gomes, a ruindade intrínseca das falas triunfalistas e maniqueístas tão usuais, a dificuldade que o PT terá de superar o lulismo, dar cara própria à sua candidata e qualificar seu discurso como força reformadora.

Se o PT e os demais partidos conseguirem sacudir a poeira e ganhar consistência, 2010 estará salvo. Se fracassarem, continuaremos na mesma velha e boa toada de sempre.

Bom ano novo a todos. [Publicado em O Estado de S. Paulo, 26/12/2009, p. A2]

quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

O PT à esquerda


Obrigado, Nani.

Circula nos ambientes políticos a informação de que o PT pretende retomar um discurso de esquerda para as próximas eleições, fato que estaria a ser demonstrado por recentes declarações e documentos do partido.

Antes de saudar o fato, que pode contribuir para que se ganhe maior clareza no jogo político, é preciso avaliar a situação. O que indica ela? A presença de um movimento para enquadrar Lula, seu governo e sua candidata à sucessão, que carregam consigo uma imagem centrista e moderada bem consolidada? Ou o desencadeamento de uma operação para reerguer o partido e voltar a inseri-lo nos trilhos originais, de onde escapou nos últimos anos?

Enquadrar Lula é algo de que não se deveria cogitar, pois ele se tornou, com o tempo, maior que o PT. Hoje, segue carreira-solo, administrada por um seleto grupo de gestores leais e por uma imponente onda de culto e adoração popular, que impede até mesmo o exercício da ponderação, proíbe críticas e lhe concede oxigênio suficiente para dispensar maiores amarras e compromissos institucionais, incluindo os partidários. Seria como imaginar, mutatis mutandis, o enquadramento de um Fidel, um Jânio ou um Prestes.

Mas partidos de esquerda são seres condenados a explicar e justificar todos os seus passos. Nesse movimento, são sistematicamente tentados a reiterar convicções de antes, com as quais foram batizados e ganharam selo de identidade. Vivem de forma dilemática: precisam se renovar sempre, mas não conseguem fazer isso com facilidade, pois as tradições pesam e muitos de seus integrantes se recusam a seguir as novas orientações, regra geral decididas e impostas pelas cúpulas.

Dá-se algo assim com o PT, que desde o final dos anos 1990 enveredou por um caminho reformista, expulsou parte de suas alas tidas como “radicais”, chegou à Presidência da República e se converteu em expoente do universo social-democrata. Ao longo desse percurso, muitos erros foram cometidos, espocaram crises de identidade, diluições ideológicas e regressões fundamentalistas. Seria lógico, portanto, que suas direções se dedicassem a evitar a debandada dos militantes e eleitores saudosos dos velhos tempos, tanto quanto a atrair e soldar a adesão de novos seguidores.

A retomada de um discurso de esquerda pode ser vista como uma resposta a essa situação, uma estratégia direcionada mais ao público interno ampliado (militantes e eleitores) do que à sociedade. É como se as cúpulas partidárias estivessem a dizer: “continuamos de esquerda, não nos abandonem, não esmoreçam!” – num apelo para que não se multipliquem eventuais fugas rumo ao PSol ou à candidatura de Marina Silva, por exemplo.

É isso, mas não é somente isso. O PT também deseja se fazer presente nas campanhas de 2010, orientar seus candidatos, dar a eles combustível, recursos de combate e persuasão. Está a se movimentar para isso.

Se pensarmos em termos abstratos, típico-ideais, um partido cumpre essa meta em dois planos: olhando para as amplas massas e para o futuro.

No primeiro deles, elabora um kit de sobrevivência, um conjunto de princípios essenciais traduzidos em expressões simbolicamente eloqüentes e de fácil manuseio, estilo Estado vs. Mercado, projeto popular e democrático vs. projeto do Consenso de Washington, governo nacionalista e internacionalista vs. governo entreguista, o nosso Brasil vs. o Brasil deles, e assim por diante. É nesse plano que se apresentam as realizações governamentais, as virtudes do líder e de seus sucessores, os planos sórdidos dos adversários. A intenção, aqui, é organizar um guia para a ação e, acima de tudo, formar opinião. Sim, porque os eleitores precisam de formadores de opinião, mesmo quando são de esquerda.

No segundo plano, o partido elabora uma teoria da sociedade e da transformação social que julga a ela corresponder, determinando o lugar que ele próprio, partido, e seu entorno ocupam nesse processo. É um plano sofisticado, que requer uma análise do mundo, a definição de estratégias de longo prazo e das alianças fundamentais, o reconhecimento claro dos obstáculos e das possibilidades concretas de mudança. Nele, a simplificação não tem lugar e a agitação deve ser substituída pela argumentação.

Na dimensão típico-ideal, esses dois planos caminham juntos, se retroalimentam O partido fala para as massas com um discurso sustentado pela tradução criteriosa de uma teoria social consistente, que é corrigida e ajustada à medida que se obtém o feedback da sociedade.

Salvo avaliação mais aprofundada, o que parece estar a ocorrer no Brasil expressa uma disjunção entre esses dois planos, com uma concentração unilateral no primeiro deles. O PT está esquentando as turbinas para oferecer a seu “povo” o empuxo necessário para uma ação vitoriosa em 2010. Está a produzir armas de combate, agitação e identificação. Como seria mesmo de se esperar.

Não há porque alguém ficar surpreso ou incomodado com isso, que é política em estado bruto, igualmente praticada pelos demais partidos. Os puros de espírito, as almas mais sensíveis, poderão torcer o nariz para as acusações infundadas, os auto-elogios extremados e passionais, as manobras dedicadas exclusivamente a prejudicar inimigos e adversários. Terão de entender que política também é feita disso.

É feita disso, mas não somente disso. Se o PT se julga ou pretende ser um partido de esquerda de fato, não pode permanecer estacionado no plano da agitação, do discurso fácil para as massas. Precisa ir além e acoplar a esse plano um segundo plano, de elaboração teórica, produção cultural e projeção do futuro, como, de resto, espera-se que façam todos os demais partidos. Sem isso, ficará no meio do caminho e não se completará como partido de esquerda. Poderá até ter sucesso e vencer em 2010, mas não contribuirá para integrar a sociedade, convencê-la da necessidade de uma reforma social e fornecer-lhe algo mais denso e duradouro do que um sonho para sonhar. [Publicado em O Estado de S. Paulo, 28/11/2009, p. A2].

domingo, 29 de novembro de 2009

O professor e a sala de aula

Eis uma entrevista para ser lida por todos que se dedicam à docência ou se interessam pela atividade dos professores.

Aparecida Neri de Souza, professora da Faculdade de Educação da Unicamp, é dessas intelectuais que honram o título que carregam. Combativa, estudiosa, pesquisadora, tudo em tempo integral. Seu grupo de estudos se concentra no sentido social da modernização do trabalho, com foco, evidentemente, no trabalho docente. Foi nessa área que fez seu pós-doutorado, no Laboratório de Trabalho e Mobilidades da Universidade de Paris X.

Neri é uma defensora dos professores, especialmente os do ensino médio e fundamental e da rede pública. É uma militante que não tem medo de caminhar contra o vento e desafiar o coro dos contentes. Vive pensando a profissão, lutando por ela e por sua valorização.

Na entrevista que concedeu para a Revista Educação, nº 151, que está nas bancas, detona os que acham que o professor pode ser um “leigo”, isto é, alguém sem formação específica, pensado como expediente para solucionar alguns dos lancinantes problemas da educação. E defende a necessidade estratégica de maior definição do que seja o campo docente. Para ela, o estabelecimento de um currículo comum, de uma norma válida para todos, em vez de retirar a autonomia do professor, dá a ele melhores condições de exercer sua função e contribuir para a formação de uma população de cidadãos. Se bem construída, a normatividade aumentaria as possibilidades de o professor ter uma visão de conjunto do seu trabalho e de interagir livremente com seus alunos naquele espaço demarcado que é a sala de aula.

A entrevista pode ser acessada neste link.

sábado, 14 de novembro de 2009

A construção de um estado


Tive a honra e o prazer de prefaciar o livro de minha amiga Marisa Bittar sobre a história do estado de Mato Grosso do Sul. Foi uma satisfação dupla. Primeiro, por ter podido me incorporar ao trabalho de uma pesquisadora incansável, que dedicou vários anos ao trabalho de recuperar o processo de construção daquela unidade da federação. Segundo, por ter podido participar, graças a ela, de uma reflexão de grande relevância para a história moderna do Brasil.

Mato Grosso do Sul: a construção de um estado acaba de ser publicado pela editora da Universidade Federal, a UFMS, com apoio de diversos órgãos mato-grossenses do sul. São dois volumes, com mais de 900 páginas, que oferecem ao leitor uma ampla compreensão sobre a gênese do Estado que começou a ser sonhado no final do século XIX, após a Guerra do Paraguai. Com base em fontes inéditas e raras, Marisa analisa o recrudescimento do regionalismo sul-mato-grossense, que se transformou em divisionismo e teve o seu desfecho quase cem anos depois, quando, em 1977, a ditadura militar dividiu Mato Grosso e criou Mato Grosso do Sul.

Problematizando a forma pela qual ocorreu essa separação, sem consulta às duas populações interessadas, norte e sul, a pesquisadora buscou investigar as condições que possibilitaram a vitória de uma causa perdida, privilegiando a conjugação dos interesses regionais à geopolítica do regime militar, que, por sua vez, transcorria no contexto da Guerra Fria. Na sua visão, ter sido criado por um ato ditatorial constitui a marca de nascença de Mato Grosso do Sul, tema que deve ser contextualizado no cenário de interesses da oligarquia agrária sulista, nos projetos separatistas frustrados, na rivalidade com a capital Cuiabá.

Valeu a pena a divisão de Mato Grosso? Marisa está convencida de que essa é a pergunta a ser enfrentada, porque dela emerge o desafio de um projeto político capaz de justificar a criação de Mato Grosso do Sul.

Marisa Bittar é historiadora, com doutorado na USP. Atualmente, é professora titular de História e Filosofia da Educação da UFSCAR. Seu belo e vigoroso livro certamente se converterá na principal fonte de referência para o estudo da região e particularmente de Mato Grosso do Sul.

Informações sobre o livro podem ser solicitadas à Editora UFMS: conselho@editora.ufms.br

sábado, 7 de novembro de 2009

Seminário sobre Bobbio e direitos humanos


Entre os dias 9 e 12 de novembro, a Universidade Federal da Paraíba-UFPB realiza seu V Seminário Internacional de Direitos Humanos, que este ano homenageará o centenário de nascimento de Norberto Bobbio. Será uma excelente oportunidade para se voltar a pensar no legado desse importante filósofo político italiano, morto aos 94 anos em janeiro de 2004.

Bobbio está incorporado à cultura política, jurídica e sociológica brasileira, como de resto acontece em boa parte do mundo. Colou-se à dinâmica política do país e ao debate cultural que acompanhou a luta contra a ditadura militar e a redemocratização a partir da década de 1980. Foi lido e disputado tanto por liberais, patrocinadores de seu ingresso editorial no Brasil, quanto pela esquerda democrática que, ao perder o marxismo como referência e se projetar em busca de novas alternativas socialistas, acabou por se converter em uma de suas principais promotoras. Dialogou, por vias diretas e indiretas, com comunistas gramscianos, trotskistas, social-democratas e stalinistas, tomou assento na universidade e tornou-se referência do associativismo democrático, que ficou particularmente tocado pelo modo como ele pensou o conceito de sociedade civil. Sensível tanto ao borbulhar suave das idéias quanto aos fatos mais duros da política, Bobbio se converteu numa personalidade intelectual de livre trânsito em diferentes círculos brasileiros.

O seminário de João Pessoa reunirá um representativo grupo de estudiosos da Europa e da América Latina, que têm dialogado com diferentes aspectos do pensamento e da obra de Bobbio. Entre eles, podem ser mencionados Alberto Filippi (Itália), Alice Ribeiro Casimiro Lopes (UERJ), Assis Brandão (UFPE), Carlos Henrique Cardim (IPRI / UNB), Celso Lafer (USP), Danilo Zolo (Itália), Acílio da Silva Estanqueiro Rocha (Universidade do Minho, Portugal) e Pier Paolo Portinaro (Itália).

Informações e detalhes sobre o seminário podem ser obtidos nesse site.

terça-feira, 3 de novembro de 2009

O livro póstumo de José Roberto Melhem




No próximo dia 9 de novembro de 2009, segunda-feira, às 19 horas, na Casa das Rosas, Avenida Paulista, 37, será lançado Uma Tarde Destas, livro póstumo de José Roberto Melhem. A edição é da Imprensa Oficial de São Paulo.

Conheci Melhem no final dos anos 70 nos ambientes da esquerda democrática que lutava contra a ditadura. Ficamos amigos. Escritor, advogado, fino analista político, grande conversador, pessoa de sensibilidade artística e conhecimento técnico apurado, foi sempre um apaixonado pela idéia de se ter um mundo mais justo, democrático e igualitário. Preso e processado durante a ditadura, nunca se intimidou ou deixou de fazer política. Com a redemocratização, ocupou vários cargos públicos, como por exemplo o de Secretário Adjunto da Secretaria Estadual de Administração, no início da década de 1990.

Foi também presidente do Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico-Condephaat de São Paulo por quase dez anos, o que lhe possibilitou agir e desenvolver um articulado pensamento sobre essa área estratégica.

Melhem acreditava que o maior desafio que se apresenta para a tarefa preservacionista é “o do desenvolvimento das cidades em harmonia com a preservação dos valores culturais nelas reconhecidos”. Não aceitava nem que o desenvolvimento urbano fosse cego para a preservação do patrimônio, nem que o preservacionismo impusesse a estagnação urbana. Considerava falsa a incompatibilidade entre a preservação e as mudanças das cidades, que atribuía “a um grande inimigo que é justamente a falta de planejamento e disciplina adequados”, como disse em um de seus discursos. Achava uma distorção que os núcleos urbanos que se melhor se conservaram foram os que pararam no tempo. Queria uma opção mais inteligente: “A preservação pode e deve conviver com o progresso, precisamente porque ambos são vitais para que a sociedade alcance o futuro sem o risco de perder-se nos desvios indesejáveis de uma história sem rumo e sem memória”.

Como escritor, Melhem foi um contista refinado. Suas criações refletiam o olhar sagaz que tinha para a vida e a enorme capacidade de contar histórias. O escritor Milton Hatoum, que faz a apresentação de Uma Tarde Destas, observou com precisão: "Como diz um dos personagens, 'nem tudo na vida são enredos'. Isso se ajusta às narrativas deste livro, em que tudo depende do modo de narrar. E Melhem é um grande narrador, um dos mais talentosos da literatura brasileira contemporânea!".

Melhem morreu em 6 de abril de 2008, aos 64 anos. Deixou um vazio nos muitos amigos que tinha, nos familiares e na vida política e cultural de São Paulo. Seu livro póstumo, que ficou lindo, nos ajuda a preencher esse vazio.

segunda-feira, 2 de novembro de 2009

Ray e Stevie Living for the city




Pra quem gosta de boa música, um Ray Charles vale muito. Um Stevie Wonder também. Imaginem então os dois juntos! Passeando pelo Youtube, descobri o vídeo em que esses dois monstros sagrados da blak and soul music – geniais blind boys da música americana – tocam e cantam juntos. Living For The City é uma composição de Stevie, letra linda, corrosiva, pura poesia sobre a dura vida de negros e brancos em New York City. A performance de Ray é absolutamente fantástica.

Impossível não gostar e se emocionar: http://bit.ly/lRzpB

sábado, 24 de outubro de 2009

Homenagem a um grande intelectual público


Luiz Palma, O Aleph

A morte do cientista social Carlos Estevam Martins, aos 74 anos, ocorrida duas semanas atrás em São Paulo, privou a intelectualidade brasileira de uma de suas aves raras.

Carlos Estevam foi daqueles intelectuais de visão abrangente, refinada, avessa a modas, especializações e formalidades. Não atuou somente como professor, ainda que sua carreira docente tenha sido brilhante, tanto na USP quanto na Unicamp. Recusou-se a seguir passivamente os cânones da academia, escapando de suas armadilhas e de sua arrogância. Mergulhou no mundo da gestão e da política, atuando durante anos como diretor de projetos da FUNDAP e sendo Secretário de Estado da Educação por duas vezes, na primeira metade da década de 90, durante os governos do PMDB. Nascido no Rio de Janeiro, trabalhou no ISEB e foi um dos fundadores, o primeiro diretor e o autor do manifesto do Centro Popular de Cultura, da UNE, criado em 1962. Ali, ao lado de Vianinha, Leon Hirszman e Ferreira Gullar, dentre outros, experimentou os caminhos da arte popular. Depois do golpe de 64 e do fechamento do CPC, mudou-se para São Paulo e participou da formação do CEBRAP em 1969, juntamente com Fernando H. Cardoso, Francisco Weffort, José A. Giannotti e Francisco de Oliveira.

Carlos Estevam rejeitou a torre de marfim da especialização e dos princípios abstratos sem se converter em mero operador tecnopolítico. Foi um intelectual público, bem próximo daquela figura que o marxista italiano Antonio Gramsci tornou famosa: um agente de atividades gerais que é portador de conhecimentos específicos, um especialista que também é político e que sabe não só superar a divisão intelectual do trabalho como também combinar “o pessimismo da inteligência e o otimismo da vontade”. Ave rara.

Foi também escritor talentoso, que escrevia para ser lido por todos, não somente pelos pares ou iniciados. Publicou dezenas de ensaios sobre história das idéias, política externa brasileira, redemocratização, sistema político, Estado e capitalismo no Brasil. Alguns de seus livros são preciosos, como A tecnocracia na história (1975), Capitalismo de Estado e modelo político no Brasil (1977), O circuito do poder (1994).

A polêmica foi sua marca registrada, impulsionada por uma inventividade exuberante.

Quando, em 1977, saiu Capitalismo de Estado e modelo político no Brasil, a discussão correu solta. Choveram aplausos e questionamentos. Passado o primeiro temporal, Carlos Estevam escreveu um artigo em resposta às críticas, “A democratização como problemática pós-liberal”, publicado pelo Cebrap. Queria ampliar a discussão, explicitar as “alegrias e dores de cabeça” trazidas pelo livro. Elaborou um texto sintomático do seu modo de ser, saudando os “intelectuais capazes de dar o devido valor ao debate de idéias, audazes trapezistas dispostos a passar por cima das divergências de opinião, que sempre existem, para ir buscar a compreensão empática do ponto de vista alheio”. Nele, declarava sua disposição de dialogar com a sociedade. “Os mandarins são misantropos, comunicam-se com o público impessoalizado ou com os discípulos, jamais com o próximo”.

Foi uma oportunidade de ouro para que se clareassem posicionamentos e estilos: “Nunca consigo fugir à tentação de imaginar que há outros fatos além dos dados disponíveis, assim como não resisto à propensão de supor que qualquer teorização pode ser refeita por meio de mudanças de ênfase, graças à introdução de novos elementos conceituais até então não incluídos na estrutura do marco teórico”. Não duvidava do valor e da utilidade das pesquisas empíricas, mas não admitia que seus resultados pudessem resolver questões e pendências que se alojavam em outras dimensões da vida real. Para ele, o mais importante era interrogar o “presente como fluxo”, buscando as “oportunidades, promessas e ameaças que ele encerra para o futuro dos diferentes grupos e classes sociais”.

O rigor com palavras e conceitos foi outra de suas preocupações. Numa das últimas intervenções, em 2005, na revista Lua Nova, manifestou sua perplexidade “face ao que se diz e se prega a respeito de democracia, cidadania e temas conexos”. A situação derivada da hegemonia neoliberal e da emergência de uma “nova esquerda romântica” degradara o vocabulário. Em tempos de despolitização, tudo tenderia à diluição. “Nova esquerda” e direita neoliberal se confundem sempre mais e estabelecem “relações homólogas” (isto é, de equivalência, ainda que não de identidade), que ajudam a despojar a política de critérios razoáveis de embate e compreensão. A questão passa a ser a defesa da “sociedade contra o Estado e os partidos políticos”, como se existisse um “Partido Único da Sociedade Civil” que dispensaria tudo o que está institucionalizado.

Daí a “maldição” lançada contra conceitos e valores essenciais para a democracia: Estado, burocracia, nação, partidos políticos, representação. No lugar deles, formando uma espécie de discurso único, um outro léxico estruturado pela dupla mercado e sociedade civil. Como então esperar que a democratização se desenvolva “numa sociedade em que a opinião pública é levada a hostilizar toda uma série de elementos ideais, quadros institucionais e mecanismos operacionais” sem os quais a democracia não pode funcionar?

Carlos Estevam Martins foi um “pessimista da inteligência”, mas em nenhum momento deixou de acreditar que seria possível lutar por um futuro melhor, tarefa para a qual seria imprescindível a presença de uma esquerda “menos subdesenvolvida, que não deixe tanto a desejar”. Como escreveu em 2005, nunca teremos “um vigoroso pensamento de esquerda se cada linha de esquerda não tiver o direito de cumprir o seu dever, qual seja, o de explicitar sua identidade, definir seus antagonistas, cultivar sua tradição e criticar e atualizar sua trajetória no campo da teoria, assim como no da prática política”.

Fará muita falta. [Publicado em O Estado de S. Paulo, 24/10/2009, p. A2.]

Eleições e meios digitais



Depois da aprovação das novas regras eleitorais, a chamada minirreforma política feita pelo Congresso Nacional, a internet entrou de fato na dinâmica das eleições. Em 2010, quando serão eleitos os governadores de estado, deputados, senadores e o Presidente da República, teremos excelente oportunidade de verificar o peso real que as novas tecnologias de informação e comunicação terão em nossa vida política. A expectativa é grande, mas são poucos os que conseguem, hoje, dimensionar com rigor o efeito político e eleitoral dos meios digitais. Terão eles alto ou baixo poder de decisão? Ajudarão a consolidar e aperfeiçoar a democracia ou serão nova arena de disputa dos grandes interesses econômicos? Modificarão o modo como os candidatos dialogam com os cidadãos, tornando o discurso político mais inteligente e mais próximo dos problemas cotidianos e das necessidades das pessoas?

No último dia 23 de outubro, o jornal Valor Econômico publicou um ótimo artigo da minha amiga Dora Kaufman e de Pedro Cabral sobre o assunto. Nele, em linguagem qualificada e direta, são apresentadas as inflexões mais importantes do tema, com foco privilegiado na situação brasileira. Vale a pena lê-lo, pois registra com clareza os novos termos do jogo eleitoral, que refletem os novos termos do jogo social, ou seja, do modo como estamos vivendo.

Vejam aqui.

segunda-feira, 12 de outubro de 2009

A política como prática cotidiana


Foi com esse mote que o jornal A Gazeta, de Vitória, ES, apresentou a entrevista que concedi ao jornalista Vitor Vogas, publicada na edição de 12 de outubro de 2009.

Por que defender a política? Isso não seria o mesmo que defender os políticos, coisa que, hoje em dia, parece mesmo indefensável? Com as instituições políticas em pronunciada crise ética, como falar de política sem se associar imediatamente ao mal ou ao mundo do poder, com sua dupla face de pressão e sedução? Na esteira dessas perguntas, muitas vezes não respondidas, os cidadãos vão se afastando da política e acabam por empurrá-la para um baú de coisas inúteis.

Mas será que justamente por ser essa a situação não é hora de remar contra a maré? De insistir na idéia de que, por mais desacreditada que esteja a política, cada cidadão deve procurar praticá-la cotidianamente e aprimorá-la naquilo que está a seu alcance? A hipótese é de que esse pode ser o caminho para evitarmos um mergulho na barbárie.

A entrevista pode ser acessada nesse link.

domingo, 4 de outubro de 2009

Gracias a la vida, Mercedes Sosa




Mercedes Sosa, "La Negra", foi mais que uma grande cantora. Defensora apaixonada dos direitos humanos, tornou-se um símbolo da esquerda latino-americana, que sempre apoiou.

Nascida na província argentina de Tucumán, começou a cantar aos 15 anos. Nunca mais parou. Foi censurada e perseguida durante os governos militares. Em 1979, em plena ditadura, foi presa no meio de um show na cidade de La Plata, juntamente com o público presente. Dias depois, partiu para um exílio em Paris e Madri, até 1982, quando voltou para a Argentina.

Gravou inúmeros sucesos: Si Se Calla el Cantor, Volver a los 17, Los Hermanos, La Carta, Sueños Con Serpientes. Gravou diversos duetos com artistas brasileiros, como Caetano Veloso, Chico Buarque, Gal Costa, Milton Nascimento, Fagner e Beth Carvalho. Era considerada uma das maiores difusoras da obra da cantora e compositora chilena Violeta Parra, depois de transformar "Gracias a la vida" em seu tema emblemático.

Mercedes lançou recentemente o álbum duplo "Cantora", indicado esse ano para o Grammy Latino. Nele, dividiu espaço com Caetano Veloso, Shakira, Gustavo Cerati, Charly García, Fito Páez, Julieta Venegas, Joan Manuel Serrat, Joaquín Sabina, Lila Downs e Calle 13.

Deve ser um belo CD. Gracias a la vida.

sexta-feira, 2 de outubro de 2009

Antídoto contra eleitores desmotivados


Está no site do Espaço Cultural CPFL o podcast com o áudio da entrevista que concedi a eles, em agosto, na ocasião dos encontros em torno do tema Política para que te quero?”, integrante da série Invenção do Contemporâneo de 2009

Qual o papel da política em nossa vida? Ainda precisamos dela para o convívio em sociedade? Em tempos de crise no senado, o que podemos esperar dos políticos e das instituições políticas?

A entrevista explora a idéia de que o Brasil hoje não se interessa pelo assunto muito por causa do comportamento de seus governantes. Mas não somente por isso. O modo de vida atual está dissociando a política do cotidiano das pessoas, que não conseguem ser suficientemente envolvidas por ela. Há uma crise de convicção na utilidade da política. Porém, apesar disso, e paradoxalmente, a política ainda segue sendo o melhor antídoto para a construção de sociedades integradas e mais igualitárias. Se os cidadãos estão apáticos, “política neles".

A entrevista também toca na questão da influência da internet nas disputas eleitorais. Ainda que muita coisa possa mudar com a utilização das tecnologias digitais nas campanhas, o fator decisivo ainda segue sendo outro. "As eleições continuam sendo vencidas por dinheiro, marketing e relações".

O podcast da entrevista pode ser acessado e baixado aqui.

domingo, 27 de setembro de 2009

Integração e estratégia


Depois do VII Encontro Internacional do Fórum Universitário Mercosul-FoMerco, realizado entre 9 e 11 de setembro em Foz do Iguaçu (PR), pode-se concluir que a integração latino-americana goza de importante apoio da intelectualidade da região, que a interpela com redobrado interesse científico e paixão cívica até certo ponto incomum nos dias de hoje. Apesar disso, enfrenta obstáculos complicados que, se não têm força suficiente para desativá-la ou paralisá-la, conseguem postergar seu desfecho e lhe dificultam a formação de uma consistente base de sustentação.

Se olharmos a questão em escala histórica, é impossível não reconhecer que muito se progrediu desde a assinatura do Tratado de Assunção (1991), marco da criação do Mercosul. O próprio FoMerco é um retrato dessa evolução. De idéia quase isolada em 2000, animada especialmente pela combatividade do jornalista Guy de Almeida, ganhou corpo, peso e densidade com o passar dos anos, a ponto de se converter num espaço acadêmico relevante no subcontinente. A cada encontro, têm sido maiores as adesões, não só de brasileiros, mas de argentinos, uruguaios e paraguaios. Na reunião desse ano, sob a presidência de Marcos Costa Lima, o FoMerco reuniu 27 grupos de trabalho, cujos coordenadores selecionaram 216 resumos para debate. É um número expressivo, que aumenta de importância quando se atenta para o teor das comunicações e a representatividade institucional de seus autores.

Também é digna de nota a multiplicação das instituições que vêm se dedicando à integração. No encontro de Foz de Iguaçu, o FoMerco teve o apoio do Centro Internacional Celso Furtado de Políticas para o Desenvolvimento–Cicef, do Colégio Brasileiro de Altos Estudos–CBAE da UFRJ, da Fundação Alexandre de Gusmão e da Universidade Federal de Pernambuco. As reuniões ocorreram na sede da Universidade Federal da Integração Latino Americana–Unila, um projeto inovador do governo Lula, cuja prioridade é formar pesquisadores e profissionais que tenham no cerne de suas respectivas áreas de conhecimento a preocupação com uma América Latina integrada.

O sucesso de reuniões acadêmicas não é indicador suficiente, mas com certeza reflete a existência de uma disposição crítica e alguma disponibilidade de quadros e idéias. Por que então a integração não avança com firmeza e ainda não se converteu em agenda efetiva para os Estados da região?

Processos de integração são construções políticas inevitavelmente lentas e complexas, fato que fica mais dramático na América do Sul, tendo em vista a quantidade de problemas, a heterogeneidade e a desigualdade nela existentes. Impulsionados por dinâmicas eminentemente econômicas e comerciais, tais processos penam para adquirir ritmo político e cultural, único terreno em que uma integração de fato pode se completar. Além disso, vivem mais ao sabor de decisões governamentais que de políticas de Estado e nem sempre conseguem se orientar por uma estratégia abrangente, sistemática, sustentável. Como se não bastasse, sofrem a concorrência, muitas vezes “desleal”, de outras dinâmicas integracionistas, de turbulências econômicas e de operações de hegemonia internacional ou regional.

Nenhuma integração se faz em abstrato. Enraíza-se na história da região que se quer integrar, na comunhão cultural de seus povos e nos interesses comuns de suas sociedades. Reflete suas possibilidades e suas dificuldades. Está determinada, evidentemente, pela situação concreta dos diferentes países e pelo modo como se vive no mundo. Hoje, por exemplo, a integração se ressente da situação de crise e enfraquecimento da política, comum a todas as sociedades contemporâneas.

Pode-se dizer assim: a idéia de integração é uma construção política que se depara hoje com um cenário de difícil politização, no qual escasseiam sujeitos (grupos, partidos, movimentos, associações) qualificados para propor uma estratégia comum de ação e dar sustentação a ela. Para vencer, ela necessita desesperadamente daquilo que mais falta: política, atores políticos, organização política. Por um lado, há o peso desproporcional do econômico, o poder de sedução e cooptação do mercado. Por outro, os governos perderam potência e os Estados nacionais viram diminuir suas margens de manobra. Na vida, há muita diferenciação social, luta por identidade e individualização, ou seja, muita dispersão e fragmentação. E a esfera política, pressionada por sua própria crise, não se mostra forte o suficiente para unir o social e fornecer a ele uma direção. Dado o déficit de subjetividade política, cresce a tentação do voluntarismo e do populismo.

Vista por esse ângulo, a integração latino-americana poderia sugerir a imagem de um projeto destinado ao fracasso. No entanto, ela continua viva e desponta como uma utopia típica desse início de século. É preciso, pois, reconhecer aquilo que a faz respirar e fluir.

Em boa medida, a integração é uma espécie de imposição da realidade globalizada do mundo. Na vida atual veloz, comunicativa, surpreendente , pequenos atos ou gestos podem desencadear verdadeiros tsunamis em questão de dias. Os sistemas políticos estão em crise, mas a política não se resume a eles. Há coisas acontecendo e potência sendo armazenada fora deles. Numa sociedade da informação, existe sempre mais espaço para iniciativas inteligentes, quer dizer, culturais, educativas, não-maximalistas, processuais e dialógicas, centradas na negociação e na articulação.

A combinação cruzada desses fatores impulsiona a integração latino-americana, fazendo com que ela se torne categoricamente factível, ainda que sempre tensa e difícil. E se, numa das curvas surpreendentes da vida, alguém conseguir injetar fantasia política na dinâmica da integração e demonstrar que ela é boa não somente para os negócios e os Estados, mas para a vida cotidiana dos cidadãos, aí então poderá haver uma adesão em massa e outra história começará. [Publicado em O Estado de S. Paulo, 26/09/2009, p. A2.]

domingo, 13 de setembro de 2009

Jornalismo em tempos de internet

Circula na internet um manifesto alemão sobre o jornalismo atual.

Vale a pena lê-lo. Num tempo de informação exacerbada, produzida por múltiplas fontes, como o nosso, toda reflexão programática sobre o “que fazer” na área ajuda bastante.

O jornalismo está hoje fortemente convidado a se ajustar, seja às novas tecnologias – que mudam o modo de escrever, editar, imprimir e pensar – seja às expectativas dos leitores. A internet, nesse particular, opera com a força de uma revolução, pois altera os parâmetros e os circuitos da comunicação, especialmente porque “subverte” as tradicionais relações entre quem escreve e quem consome o que é escrito. De repente, todos se tornam jornalistas potenciais, ainda que não exerçam a profissão.

Esse é um fato que, no mínimo, serve para que pensemos um pouco sobre o diploma que até dias atrás era exigido no Brasil de quem quisesse trabalhar numa redação. É bobagem achar que não se precisa mais de jornalistas ou que os cursos superiores de jornalismo ficaram sem sentido. Mas é inegável que entramos numa era em que será preciso ser jornalista de outra maneira, com uma formação bem mais forte antes de tudo.

A principal linha de argumentação do manifesto parte da idéia de que “os mediatêm de adaptar seus métodos de trabalho à realidade tecnológica atual, em vez de a ignorarem ou desafiarem”. Isso significaria, entre muitas outras coisas, inventar novos produtos e métodos jornalísticos, além de ampliar a incorporação das formas básicas de comunicação: "ouvir e responder, também conhecido como diálogo".

Sigam o link e pensem no assunto.