segunda-feira, 28 de abril de 2014

Olha o mensalão aí, pá!


Charge de Amarildo

Para variar, muita falação em torno da entrevista que Lula concedeu em Portugal. Há dois aspectos nela que merecem atenção.
Um tem a ver com a frase “Não se trata de gente de minha confiança”, que muitos interpretaram como sendo a confissão de que Lula quer manter distância do pessoal que está na Papuda. Não vejo assim. Ouvi várias vezes a entrevista, e penso que a interpretação certa é outra. Lula quis dizer: “Não se trata de saber se são pessoas de minha confiança ou não, e sim de reconhecer que o julgamento foi político e visou a prejudicar o PT”. Entender de outro jeito é forçar a barra e agir exclusivamente para agitar o ambiente. Nada contra que se agite, mas é preciso estabelecer a verdade dos fatos sempre.
Foi uma falha de comunicação de Lula? Pode ser, já que ele talvez tenha se deixado levar pelo calor do momento e pela preocupação de enfatizar sua posição sobre o julgamento. Mas não dá para distorcer o que ele quis de fato dizer.
O segundo aspecto tem a ver com sua opinião sobre o mensalão. Chuva no molhado. Nada há de novo nas declarações dele. Na melhor das hipóteses, valeria a pena especular sobre as razões que o levaram a repetir a ladainha precisamente agora. A partir de 2006, Lula sempre disse basicamente a mesma coisa: “Não existiu mensalão”. Ultimamente, depois que saiu da Presidência, passou a defender que seria preciso “recontar o mensalão”, que teria sido um factoide criado pela mídia, que praticamente pautou a atuação do STF e condenou os acusados.  Antes disto, em 2005, como nos lembramos todos, ele chegou a pedir desculpas à sociedade pela ação nefasta de alguns aloprados. Reformulou a opinião depois, e não a largou mais. Teria sido “simples caixa 2”, ou quiçá nem mesmo isto. A novidade, agora, é que ele quantificou melhor as coisas: o julgamento "teve praticamente 80% de decisão política e 20% de decisão jurídica”. É uma frase de efeito, sem qualquer significado que não o de agitar o ambiente.
O ruim da história é a afronta ao STF, desnecessária e inadequada. Só serviu para levantar suspeitas e desacreditar a justiça. Partindo de Lula, não ajudou nem a que se explique melhor o julgamento (que como qualquer outro julgamento do tipo é político e jurídico), nem a que se soterre a questão e se vire a página. Com a frase, o ex-presidente fez com que o mensalão voltasse ao centro do palco.
Que interesse pode haver em manter o mensalão como morto-vivo no processo político brasileiro? Alguém lucraria com isto? Penso que ninguém, nem o PT, nem os condenados e menos ainda Dilma. Ao se pronunciar sobre a questão, Lula não deve ter querido atirar no próprio pé, mas seu alvo é obscuro para mim.
Poder-se-ia pensar que Lula quis deixar acesa a chama da indignação para fazer média com o povo petista, cortejá-lo, quem sabe mantê-lo aquecido para uma futura candidatura. Pode ser também que a ideia tenha sido a de botar pressão no STF para que ele julgue o mensalão mineiro com o mesmo rigor ou com idêntica dose de “politicidade”.
A conclusão plausível, no entanto, está no subtexto de Lula, nas entrelinhas da entrevista: ele não saiu nem sairá de cena, e estará sempre à disposição para qualquer cogitação presidencial.

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