segunda-feira, 25 de janeiro de 2010

Para entender a derrota da esquerda no Chile


Ainda que fossem muitos os indícios de que o candidato direitista Sebastián Piñera – misto de senador, empresário e ricaço de hábitos extravagantes – poderia vencer o segundo turno das eleições chilenas realizado no último dia 17 de janeiro, a derrota de Eduardo Frei, da coalização de centro-esquerda Concertación, surpreendeu e causou grande comoção nos ambientes democráticos do mundo todo.

O que se passou com aquela coalizão, há 20 anos no poder e que contava com o engajamento da atual presidente Michele Bachelet, detentora de enorme popularidade entre os chilenos? Cansaço do eleitor, depois de tantos anos de continuísmo? Ou falhas políticas na condução do processo eleitoral? Teria sido consequencia da divisão entre os parceiros da Concertación? Ou a direita chilena, envolta pela sombra negra do pinochetismo, teria voltado a respirar com folga e a encurralar a esquerda, como nos velhos tempos da ditadura militar, uma das mais violentas da América Latina entre 1970 e 1990?

Entre os vários artigos e depoimentos que enfrentaram o desafio de entender o resultado eleitoral e de pensar seus desdobramentos, destacou-se a entrevista concedida pelo cientista político chileno Manuel Antonio Garreton à jornalista Laura Greenhalg, de O Estado de S. Paulo, edição do caderno Aliás de 24/01/2010. Profundo conhecedor da história política de seu país e atento analista das eleições, Garreton passa em revista os antecedentes da disputa presidencial e oferece um rico quadro da interrupção do projeto de poder da Concertación. Para ele, “não foi Piñera quem ganhou, mas a Concertación que perdeu”. Fala de cátedra: além de Professor Titular da Universidade do Chile, ele é também autor de vários livros, entre os quais Pós-Pinochetismo na Sociedade Democrática.

Vale a pena ler a entrevista.

Um comentário:

André Henrique disse...

Bom trabalho da jornalista do Estadão.
Interessante como a eleição do Chile tem se cruzado com a nossa que ainda nem chegou. A popularidade do presidente Lula, que é praticamente igual de Bachelet, é o dado que nos une. Ela não conseguiu fazer o sucessor e dizem que isso nos serve de lição, mas, pelo que li nos jornais durante a eleição chilena, os cientistas políticos informaram que Bachelet só entrou pra valer na disputa no segundo turno - fato comprovado pelo senhor Manuel Garretón.
No entanto, no Brasil, Lula já começou a campanha junto com Dilma. Acho a comparação errada. Outra coisa: o caso chileno não serve como espelho no que tange ao medo da volta da direita. Até porque, desculpem-me pela sinceridade, mas não vejo a oposição brasileira - à exceção do DEM - representando direita. O conservadorismo mais danoso ao Brasil é representado por partidos fisiológicos, como PP, PTB e boa parte do PMDB que apóiam qualquer um que está no poder em nome de cargos não de idéias. O PMDB, nas atuais circunstâncias, tem mais força no governo Lula que o PT. E, se Dilma vencer a coisa vai continuar igual. E se Serra vencer, a tendência é que apóiem os tucanos. Não estou “satanizando” o PMDB, só acho que no Brasil, esse medo da direita autoritária é exagerado. Quais são os setores que a representam? A direita está com Serra ou no governo Lula dando joelhadas no PNDH? E nem estou defendendo, na sua totalidade, o tal programa de direitos humanos (termo que camufla sanhas autoritárias e impede qualquer crítica, pois quem se atreve criticar é taxado de direita e ditador).
O que é governo de direita no Brasil, se na verdade, temos um governo de continuidade? Continuidade de programas sociais e manutenção de medidas estruturais econômicas e administrativas. Tanto no PSDB quanto no PT têm representantes da redemocratização do país, a diferença, talvez, é que nos lados tucanos ninguém vê no chavismo, um espelho. Mas isso é só um detalhe.

Outro dado interessante da entrevista foi o sociólogo dizer que o Chile não tem vocação a autoritarismos. Sendo assim, é bom que haja alternância de poder. Talvez por isso, a Concertacion tenha perdido desta feita. Não há porque ver a eleição do Piñera como retrocesso, é do jogo. No parlamento, a Concertácion ainda têm maioria, portanto, a esquerda democrática ainda é mais forte. Ao que parece, do lado autoritário, só existem saudosistas de Pinochet, mas não há ambiente para impetrar autoritarismo no Chile. (O professor me corrija se eu estiver errado, porque estou falando de atrevido, não conheço bem a política do Chile, só de ler nos livros).

Outra parte esclarecedora. Deste detalhe eu não sabia: o ex-presidente Ricardo Lagos estava sendo cogitado para disputa, assim como, o presidente da OEA, Luiz Insulza. Li uma notícia de que já abriram um site fazendo apologia para Bachelet voltar daqui a quatro anos. Todavia, Ricardo Lagos que tinha 70% de aprovação, não teve força para voltar. Será que Bachelet voltará?

Se o Frei começou com 1% nas pesquisas, ele até que terminou bem. Acho que o Chile amadureceu, é um país de instituições sólidas, que não tem problemas complexos com violência urbana, conflitos no campo e grupos insurgentes, daí, esquerda e direita, com o tempo, tornam-se homogêneas. Segundo que li nos jornais, no segundo turno, o candidato vencedor Piñera defendeu o casamento homossexual, aborto e questões do gênero, Frei ficou mais tímido diante destas questões.
Mas não podemos analisá-los isoladamente, pois representam grupos de interesses diversos, como o sociólogo citou na reportagem. Forças contrárias que se investiguem crimes cometidos na ditadura Pinochet ainda tem muita influência no governo, agora com Piñera podem ter mais flexibilidade. Aí poderá ser um atraso. Esse dado é interessante, porque a impressão que temos é que esses grupos tinham esfarelado ou enfraquecido. Entrevista esclarecedora.