quinta-feira, 15 de maio de 2014

Nas pegadas do jovem Gramsci





Acaba de ser publicado no Brasil o brilhante livro de Leonardo Rapone, O jovem Gramsci. Cinco anos que parecem séculos. 1914-1919. A edição é da Contraponto e da FAP, com tradução de Luiz Sérgio Henriques.
A começar da bela capa, o cuidado editorial impulsiona o livro. Mas o que mais chama atenção nele é a densidade do texto, a argúcia do pesquisador, a capacidade que teve de perscrutar a trajetória de Gramsci num momento decisivo de sua formação. Para quem se interessa por marxismo e especialmente pela criatividade marxista de Gramsci, o livro é obrigatório.
Ele pode ser encontrado nas livrarias ou adquirido diretamente nos sites da Loja FAP (http://loja.fundacaoastrojildo.org.br/) e da Contraponto (http://www.contrapontoeditora.com.br).
Reproduzo abaixo o texto que escrevi para as abas da capa, com a expectativa de que ajude a realçar o que o livro tem de fundamental.
" A recepção da obra de Antonio Gramsci e o diálogo com seu legado estiveram apoiados em movimentos nem sempre entrelaçados ou simultâneos. A rápida disseminação dos textos de Gramsci colaborou para a diversificação desses movimentos, até mesmo porque se fez acompanhar de uma forte inflexão acadêmica que converteu esses textos em passagem quase obrigatória de certas disciplinas especializadas.
Hoje, em linhas gerais, dois grandes esforços de reconstrução organizam o vasto campo de estudos gramscianos. Antes de tudo, tem-se buscado reter a específica contribuição teórica e conceitual do marxista sardo, mediante abordagens que seguiram ou as trilhas da epistemologia ou a tradução do aparato conceitual introduzido por Gramsci especialmente nos Cadernos do Cárcere (1929-1935). O segundo movimento de reconstrução tem buscado o Gramsci prático, o dirigente político, e segue seus passos como militante socialista na juventude e líder comunista depois da formação do PCI em 1922. 
Especialmente na Itália, nos últimos anos, têm sido frequentes as abordagens que tentam acrescentar fatos novos à intensa atividade política de Gramsci, com objetivos nem sempre nobres ou criteriosos, que oscilam, por exemplo, entre a denúncia de certos aspectos tidos como escusos da direção comunista e a exploração dos relacionamentos afetivos e pessoais de Gramsci, antes e durante seu período de encarceramento. Trata-se de uma “leitura” que procura as luzes fáceis do escândalo, da “revelação” e da reinterpretação. Mais que elucidar o que não se sabia, tais abordagens dão prioridade à polêmica de tipo revisionista, não raro dedicada a reconstruir ou a desmontar legados históricos e políticos sedimentados.
O livro de Leonardo Rapone filia-se à historiografia, mas não se deixa levar pelas facilidades espetaculares da denúncia e da revisão. Mergulha fundo num esforço para reunir, de forma histórico-sistemática, biografia intelectual e biografia política. Seu foco é o Gramsci da juventude, em um período de formação (1914-1919) que, como sempre, deixou-se marcar por muitas influências teóricas e políticas: Benedetto Croce, Henri Bergson, Georges Sorel, Robert Michels, Antonio Labriola, Max Weber. Em meio a essas influências cruzadas, é preciso descobrir o fio lógico que acabou por prevalecer, estruturando seu pensamento e forjando sua identidade.
Valendo-se da argúcia de pesquisador e de um sofisticado aparato especializado, Rapone acompanha Gramsci do aprendizado universitário à Primeira Guerra, à Revolução Russa e aos conselhos de fábrica, buscando entender o impacto que esses grandes acontecimentos tiveram em sua formação, em sua desprovincianização e em sua adesão ao socialismo. Do amplo diálogo intelectual que o jovem Gramsci manterá até seu encontro com o marxismo (e com Lênin em particular) emergirá o pensador antipositivista, hostil a determinismos estruturais rígidos, fascinado pela dimensão da vontade e da iniciativa humana, atento ao peso dos conflitos e das lutas de classes, um apaixonado observador da história de sua época. Descortina-se assim a formação de um militante e de um intelectual que, com o tempo, impulsionado em especial pela Revolução de 1917, passa a compreender e a valorizar o lugar da política e do Estado na transformação social e na modelagem daquilo que, para ele, seria a “sociedade regulada”.
O belo livro que o leitor tem em mãos oferece uma plataforma decisiva para que se possa compor uma imagem unitária de Gramsci, ajudando-nos a assimilar os Cadernos do Cárcere como momento de elaboração teórica marcada pela originalidade e que deita raízes em uma história prévia que precisa ser compreendida e integrada."

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