terça-feira, 24 de janeiro de 2012

A violência no Pinheirinho e os excessos do maniqueísmo

Foto de Nilton Cardim -SigmaPress AE
É por isso que gosto tanto das redes sociais mas não as considero revolucionárias, nem capazes de fazer revoluções. Nelas é difícil até mesmo expor opiniões abrangentes ou defendê-las com alguma serenidade. Postei ontem no Facebook uma pequena análise dos fatos do Pinheirinho. Como se diz na gíria atual, o post está bombando.

No entanto, refletindo bem a cultura das redes, cada um lê as coisas como quer e expõe seu pensamento como quer, com o fígado ou com o cérebro, ou mesmo com os dois. Nada a objetar, é parte do jogo. 

As críticas mais viscerais, agressivas e desqualificadoras me fortalecem, seria possível dizer, mas também dão a sensação chata de perda de tempo, murros em ponta de faca. 

Outras me ajudam a pensar, mesmo quando não levam bem em conta o que escrevi. Os que acreditam que sou tucano ou que defendo o PSDB, por exemplo, acham que isentei o governo estadual e o PSDB de críticas e responsabilidades, quando o texto fala exatamente o contrário. Pode ser que tenha havido um erro de calibragem em meu texto, pode ser que os interlocutores estejam querendo somente marcar posição.

Os que raciocinam como se todos os fatos fossem a tradução imediata da luta de classes e que portanto sempre há heróis e bandidos, me xingam porque meu texto deu mais importância às vítimas e aos responsáveis (ou irresponsáveis) do que aos bons e aos maus. Há os ativistas, que acham que meu academicismo me cega para o verdadeiro drama social e me conclamam a ir para a prática, que sou vacilão. 

Há quem prefira fazer análise política na base da denúncia e do espasmo verbal. Reclamam porque não verti lágrimas suficientes para os heroicos resistentes, não reconheci que partidos revolucionários ajudaram bravamente o movimento e não acusei os canalhas tucanos que esmagaram o povo pobre da periferia para acobertar o jogo sórdido que existe entre o Estado e os sugadores do sangue popular, as matilhas de lobos predadores, os especuladores e os exploradores. 

Me desculpem, não sei falar deste jeito. Acho que as coisas são mais complicadas e tento manter a conversa num plano razoável, para que se possa melhorar na compreensão do que acontece. Muito provavelmente, estou errado, mas não porque minha atitude seja errada, mas porque ela não produz efeito, murro em ponta de faca. A inteligência política reformista (revolucionária, se quiserem) e democrática parece hoje meio embotada, funciona de modo maniqueísta e aí fica difícil mesmo discutir. 

Mas vamos em frente que atrás vem gente e todos têm o direito de defender suas opiniões do modo que quiserem e puderem.
 
Com o intuito de dar sentido às linhas acima, segue abaixo o texto postado ontem no Face.

 
Não estava com vontade de discutir a operação Pinheirinho, mas acabei cedendo e vou fazê-lo rapidamente. Olhando-a sob os vários ângulos, só dá prá ver erro e incompetência. Não houve heróis nem bandidos ali. 


Ocupar terrenos vazios (ou casas, prédios, o que seja) é operação de risco. Quem não sabe disso é massa de manobra de lideranças irresponsáveis. Não é igual aos "Indignados" da Praça do Sol, ou à moçada do Occupy Wall Street. Não é porque se deva respeitar um sagrado direito de propriedade, ainda que esse um dia acabe por mostrar as garras. É porque se quer viver num local desprovido de infraestrutura mínima. Sem ajuda pública, a ação acaba por reproduzir e prolongar o estado de desigualdade em que estamos. Com ajuda pública, se institucionaliza o movimento e ele perde independência.

Não houve ingenuidade nem ignorância deste fato por parte dos que ocuparam o Pinheirinho há oito anos. Tanto que construíram um bairro por lá, com lojas, mercadinhos e igrejas. Deixou de ser ocupação. Ao longo do tempo, devem ter tentado negociar a consolidação. Talvez não tenham tido a habilidade necessária, certamente encontraram resistência e má vontade. Mas nos últimos tempos parece ter crescido no pessoal o desejo de encontrar uma saída negociada. Foi algo meio errático, porque ao mesmo tempo se fazia questão de proclamar uma disposição para resistir a qualquer custo. O movimento deve ter suas alas, e provavelmente alguns mais "radicais" atrapalharam o passo dos outros. Foram estes mais "radicais" que entraram em choque com a PM.

A Justiça decidiu e mandou a PM a campo. Mas que diabo de Justiça é esta, que não avalia as consequências sociais de suas decisões? Ali havia um bairro com milhares de pessoas. Gente pobre, que lutou prá construir algo. Oito anos! Não era evidente que uma operação militar provocaria reação? E que esta reação explodiria em choques e confrontos? Ou será que alguém acha que 2 mil soldados vão se comportar como carneirinhos diante de uma massa de 6 mil pessoas? Sabia-se disso tudo porque isso tudo era de conhecimento público. Mas não houve uma voz sensata que ponderasse e suspendesse a operação. A falta de flexibilidade causa espanto porque, no dia anterior, o Tribunal Regional Federal havia suspendido a reintegração de posse e também porque, uma semana atrás, um acordo entre as partes envolvidas já estava bem encaminhado. 

Conclusão da história: o que era para ser mero ato jurídico converteu-se em campo de batalha. Não havia inimigos nem “classes perigosas”, mas uma guerra terminou por eclodir.  O que era para ser ato localizado, pontual, converteu-se em tema nacional e eleitoral. Em suma, todos perderam (uns bem mais, com certeza) e as autoridades deram uma demonstração de inflexibilidade e incapacidade de avaliar cenários.
E os partidos, as lideranças e os movimentos democráticos, onde estavam nesta hora?

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