Depois do que aconteceu na
semifinal jogada no Mineirão, está aberta a temporada de caça aos responsáveis.
Muita gente chateada,
deprimida, chorando, querendo a cabeça de jogadores, CBF e comissão técnica. No
estádio, vaiaram feio Fred e Oscar. Brasileiro gosta de achar um culpado e
individualiza tudo. Até no futebol, que rola sempre como se houvesse um
salvador, um gênio que num estalo resolverá tudo. Agora, muitos sairão em busca
do responsável, de uma explicação que explique o que se considera “inexplicável”,
como se na vida houvesse a intervenção constante de forças misteriosas. Falam de
“pane”, do “apagão” que teria baixado nos jogadores entre os 20 e os 30 minutos
do primeiro tempo, quando os alemães fizeram quatro gols seguidos. O 7 a 1 da
semifinal aconteceu porque a Alemanha deu um banho tático, técnico, físico e
emocional na seleção brasileira. Os alemães foram superiores desde o início.
Não encontraram resistência e no segundo tempo limitaram-se a administrar o
jogo. Mesmo assim ainda fizeram dois gols. Não foi pane, foi erro tático,
ruindade coletiva e desequilíbrio emocional. Explicitação plena da desmontagem
de um modo de jogar futebol.
A maioria esquece que
equilíbrio emocional integra a preparação para disputar uma competição de alto
nível. Se os jogadores estão frágeis emocionalmente, se não conseguem assimilar
a contusão de um companheiro ou a passagem para a reserva, então estão carentes
de preparo, de estrutura. Aí chamam uma psicóloga na véspera do jogo para ver
se ela, num passe de mágica, estabiliza a moçada. Não adianta. No dia do jogo,
voltam a cantar o hino com furor, abraçados, estendem a camisa do companheiro
ausente, como se ele tivesse morrido ou sido convertido em símbolo de um grupo “guerreiro”.
Patético, over demais.
Num momento em que ninguém
entende bem o que se passou em campo, parece importante lembrar que tomar sete gols
da Alemanha é tão somente a prova final de que o futebol brasileiro parou no
tempo. Está despreparado para enfrentar o padrão de jogo atual. Nas outras
partidas desta Copa o desempenho técnico também foi muito ruim. A Alemanha foi
o primeiro adversário propriamente forte. Antes a seleção enfrentou bons times
(especialmente Chile e Colômbia) e conseguiu passar. Parou num adversário muito
superior. Em nenhum momento jogou bem. A derrota estava escrita nas estrelas,
embora os torcedores não a admitissem, não conseguissem vê-la. O futebol jogado
no Brasil é medíocre, seria escandaloso se a seleção terminasse campeã. O
campeonato brasileiro está aí prá quem quiser ver.
Escrevi em outro post, antes do
início da Copa: “O brasileiro acha que futebol é um esporte que depende do
estalo de genialidade de um ou outro Garrincha, de um novo “rei do futebol”.
Não valoriza esquemas táticos, disciplina, preparo técnico, estudo e espírito
coletivo, debochando das escolas que primam por isso, como é o caso da
Argentina, da Espanha e da Alemanha. Nossos atletas são predominantemente
simplórios em qualquer quesito que se queira. Toscos. Alguns poucos se
distinguem, mas no conjunto não passam de boleiros. Futebol, em minha opinião,
deveria ser praticado por times que reúnam talentos individuais, disposição
tática, transpiração e entrega coletiva. Raramente temos isso no Brasil”.
Não deveriam falar de complexo
de vira-latas. Mas sim em esforço coletivo para exigir a reinvenção do futebol
por aqui. A começar da defenestração dos cartolas, da reforma radical CBF, de
uma mudança no modo como o esporte é gerenciado e organizado. Nunca estivemos
tão ruins. O jogo é de baixíssima qualidade, o nível, o profissionalismo e o preparo
dos jogadores são precários, os cartolas são patéticos e corruptos, a CBF é tão
ruim que sequer dá para descrever. O
sistema é organizado de modo sofrível, contra a população e a serviço exclusivo
do mercado da bola. As partidas são tristes, há excesso de faltas, poucos gols,
os campeonatos são pessimamente organizados, as torcidas se afastam dos
estádios. Um espetáculo de horror.
Não dá prá continuarmos
deitados nas glórias do passado, sem humildade e inteligência para reconhecer
erros e falhas, limites táticos e técnicos. Hora de juntar os cacos e refazer o
caminho. Que pelo menos se aprenda com o fracasso.
Se derrotas servem para alguma
coisa, que os sete gols alemães sirvam para impulsionar uma mudança: uma
revolução. Organizacional, de mentalidade, com um componente forte de “desmercantilização”
e uma injeção de profissionalismo bem compreendido. Recomeçar de baixo,
ensinando aos garotos que futebol exige dedicação, domínio de fundamentos, não
é um lance de malabarismo e genialidade a ser treinado repetidamente para
atrair o olhar cobiçoso de algum empresário. Nossos jogadores só
aprendem respeitar táticas e a chutar bem quando saem do país.
Não será fácil, com a estrutura
que está aí. Que decline ao menos a arrogância futebolística, esse lance de que
estamos predestinados a exibir ao mundo a qualidade inimitável do nosso futebol.
Isso acabou, se é que algum dia existiu de fato. É preciso olhar no olho da
realidade e aceitar o futebol como ele é.
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