Enquanto a população, e sobretudo os emergentes das várias classes , quer dizer, aqueles que estão conseguindo se fixar como “mercado consumidor”, deram nó em pingo d’água para fazer suas compras; enquanto se insinua por aí um novo estilo de consumidor, mais “consciente” e, portanto, mais seletivo e menos conspícuo; enquanto industriais e lojistas contabilizam o quanto ganharam e deixaram de ganhar ao longo do ano – enquanto tudo isso rola, muita gente perde tempo batendo boca prá saber se 2013 foi ou não um ano de expansão do consumo.Não sou economista, nem muito menos comentarista econômico, mas percebo algumas coisas que não aparecem em dados e porcentagens. Coisas que parecem claras, e que extraio da lógica e de muita conversa com as pessoas nas ruas.Impulsionado pelos efeitos positivos das políticas oficiais de incentivo ao consumo e ao crédito, pela generalização maciça do cartão de crédito e pelo aparecimento de uma massa de milhões de brasileiros que finalmente conseguiram ingressar no mercado de consumo, graças precisamente aos benefícios sociais governamentais e à maior oferta de bens, o comércio continuou a crescer, e as vendas de Natal refletiram isso. Mas não bombaram, o que também dá prá entender. Se mais gente entra no mercado, se há mais publicidade e produtos, como o comércio não cresceria? Ele cresce porque há elasticidade, porque tem gente que estava fora e quer entrar. Mas não pode crescer indefinidamente, sempre a taxas elevadas, porque a vida não funciona assim.Associações comerciais constatam coisas que funcionam como lobbies: o consumo nas lojas físicas decaiu e há mais medo da inadimplência, o que refreia o consumidor. Querem menos impostos, menos “custo Brasil”, menos juros. Valorizam sua função na estrutura da economia. Tem suas vozes para proclamar que “algo precisa ser feito para o país não parar”. E usam e abusam de pesquisas como a da Serasa, que indicam que as vendas de Natal cresceram somente 2,7% em todo o país na semana de 18 a 24 de dezembro, na comparação com igual período do ano anterior. Dados de 1 semana (!!!) acabam sendo usados para sugerir que a luz amarela acendeu;Mas as usinas de informação também constatam que cresceu o consumo eletrônico, que bateu recordes anteriores e mostra ter largo fôlego. Qualquer um sabe: hoje é prática usual – de todas as classes – passar nas lojas para ver, tocar ou experimentar um produto e depois ir para casa, sentar diante do laptop e pesquisar o melhor preço eletrônico para comprar. A coisa funciona, evita-se o aborrecimento das lojas, a entrega é feita. Há alguns tropeços, falhas e frustrações, como em tudo, mas no geral é um ato de consumo fácil. Limpo... Somando tudo, o comércio físico e o eletrônico, o resultado não pode ter sido ruim.Do mesmo modo que há muita gente revendo ou moderando hábitos de consumo. Por um lado, há mais desconfiança em relação ao futuro. Não por causa do governo ou da política econômica, mas por culpa da vida: essa é uma época de insegurança e risco e as pessoas não precisam ler Bauman ou Beck para sentir isso. Os governos fazem seu discurso costumeiro, de que estão acima de flutuações estruturais e somente praticam o bem, o certo e o seguro. Mas não são totalmente honestos nisso. Fazem política, porém. Temos de dar descontos.Por outro lado, há mais gente pondo em xeque o padrão capitalista selvagem de consumo, aquele que cresce sempre mais, sem critério, no embalo de promoções, propaganda, estilo e exibicionismo. Muitos jovens, independentemente de terem mais ou menos dinheiro, praticam formas mais conscientes de consumo. São mais roots, digamos assim. Gostam de coisas alternativas. Compram menos roupas e quinquilharias. Andam de transporte público e veem o automóvel como último recurso. Se têm dinheiro, poupam e guardam para fazer uma viagem cult, por exemplo, para comprar um livro ou ir ao teatro.Essa moçada não é seguramente a maioria, mas precisa ser considerada com atenção. Assim como a desconfiança intuitiva dos emergentes. Não é verdade que as pessoas tendem a se atirar compulsivamente às compras, ainda que comprem bastante e muitas vezes condicionem sua felicidade ao quantum de coisas adquirem. 5% de inflação no ano é algo que se sente, não deveria ser banalizadoOs que se esmeram em bater boca para atacar ou defender a política econômica e as opções governamentais não estão a discutir prá valer. Fazem mais jogo de cena, esgrimindo dados comerciais para reforçar posições políticas.Dados são dados: não provam nada. Servem para ser interpretados e para indicar algumas tendências. Isso quando são de boa qualidade, o que nem sempre acontece.Dizer que as vendas de Natal foram boas, ótimas ou fracas não prova que a economia está bem ou mal. Suspeito que não prove nada, aliás. Somente indica uma disposição meio tola de politizar tudo, de satanizar a “mídia de direita”, de descobrir inimigos por toda parte, de fazer lobby e agitar.É uma forma ruim de terminar o ano. Indica que chumbo grosso vem por aí, quando começar de fato o processo eleitoral.
Porque a política democrática administra o presente mas retira sua poesia da construção consciente do futuro.
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