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By Harry Köppl |
Muito oportuno
e muito bom o artigo de Renato Janine Ribeiro publicado no Valor Econômico de
hoje. Ele privilegia um ponto que, em minha opinião, contem a chave para a
requalificação da política entre nós. Algo mais importante que reformas
políticas, sem que se desprezem evidentemente os
eventuais efeitos positivos que possam decorrer de algum reformismo.
O ponto
é o seguinte, nas palavras de Janine: “O Brasil chegou ao fundo do poço, em
termos de debate político. Não lembro nenhuma época das três décadas, desde a
democratização de 1985, em que tenhamos estado tão baixo. Nunca tantos
brasileiros tiveram acesso a um veículo, como a internet, que transmite tantas
informações e proporciona uma participação assim ativa no debate, por meio das
redes sociais - e, no entanto, nunca foi tão estéril a discussão de ideias e
projetos para a sociedade. Para quem esperou que a rede de computadores
constituísse uma ágora - o nome grego para a praça na qual o povo reunido
debatia e decidia as questões políticas - a frustração é enorme. Nossa
democracia sobrevive, mas graças mais aos tribunais do que ao povo ou à mídia.
Digo isto com tristeza”.
Não há
como contestar, ele tem toda razão. Podemos lembrar, para aliviar a constatação
dura, que há algumas ilhas de qualidade flutuando nas redes, algumas brechas
por onde passa o bom-senso, alguns esforços para fazer com que prevaleça o uso
democrático da razão. Mas, olhando como um todo, o que se mais vê é uma prática
pouco dialógica, cheia de estigmatizações e “cobranças”. Tipo assim: digo que a
Petrobrás enfrenta alguns problemas de gestão e logo surge alguém para me acusar de
ser um privatista; se falo que o Bolsa Familia não resolve sozinho o problema
da desigualdade, aparece um cara que me catapulta para o campo dos reacionários que são
contra as realizações do governo Lula. Entre os políticos, entre os juízes do STF, entre os intelectuais, não há debate, mas basicamente uma preocupação de "vencer a discussão", se necessário mediante a desqualificação dos argumentos contrários. Inexiste vontade de criar convergências, de fazer com que a discordância ou a divergência de um debatedor ajude a compor uma visão mais fina e abrangente da situação. A meta é destruir os adversários.
Defendi
esse ponto na mesa-redonda de que participei na ANPOCS semana passada. Disse: não temos a emergência de posições de direita no país, e muito
menos elas foram projetadas pelos protestos de junho. O que temos na verdade é o
encolhimento das esquerdas e o empobrecimento brutal do debate democrático. Em decorrência, disputamos o sentido das coisas mas não conseguimos compreendê-las adequadamente, nem muito menos aprender com elas.
O texto
de Janine explora com competência esse cenário. Não recusa reformas pontuais, melhorias
tópicas ou mais fiscalização, mas percebe que elas não bastarão. “O problema
somos nós, cidadãos, eleitores, que não fazemos nossa parte”, escreve. Sua
conclusão merece ser considerada com atenção:
“O que
propor? Algo que parece ingênuo, mas que é básico do ponto de vista ético.
Homens e mulheres de boa vontade, empenhados em melhorar nosso quadro político,
deveriam assegurar um debate de qualidade. Isto não é abrir mão de convicções
políticas, mas é reconhecer que há gente decente dos dois grandes lados de
nosso espectro partidário, e que a vitória esmagadora de uma parte não é
possível - nem desejável. Isso exige evitar palavras grosseiras, como petralha
e tucanalha, que desqualificam em bloco muitas pessoas boas que fazem trabalho
bom. Isso significa, sobretudo, fazer uso bom - e não mau - da vantagem
histórica que é ter, desde 1994, disputando os principais cargos do país, dois
partidos acima da média, PSDB e PT - e, este ano ou em breve, a Rede. Comparem
isso a qualquer momento de nossa história anterior. Não podemos desperdiçar as
conquistas das últimas décadas. Desde 1985 estamos construindo uma democracia
sustentável. Mas precisamos que ela não fique só nas instituições, que se
enraíze nos corações”.
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